domingo, 14 de dezembro de 2014

O calor e a casinha

Esse é um dos períodos do ano que mais me incomodam fisicamente. Suor, mal estar, cansaço excessivo, falta de apetite etc etc etc. O sol do verão produz uma das piores sensações que eu sinto.

Sem falar nas pessoas.

Só eu acho que as pessoas ficam loucas no verão?

As praias, os bares, as ruas, tudo fica demasiadamente cheio.

Não lembro exatamente quando foi que me dei conta disso, mas acho que sempre foi assim.

(*)

Um dos bairros que foram mais presentes na minha infância foi a Liberdade, em salvador.  O maior
bairro da cidade. Meu pai e meus tios nasceram e se criaram por lá, e minha vó morou lá até os meus 10 anos de idade.

A casa dela ficava na principal rua do bairro. Uma sacada enorme (depois de adulto não me pareceu tão grande assim) mostrava todo o agito de um grande centro urbano. Foi ali que, pela primeira vez, presenciei um assalto. Um cara puxou a bolsa de uma moça e correu ladeira abaixo. Por um momento o mundo ficou esquisito. Depois passou.


Lembro-me que quando íamos dormir, era recorrente o barulhinho ao longe dos últimos ônibus passando na rua para recolher-se.

Na verdade, a casa dela não era bem uma casa. Era um apartamento num desses prédios antigos, completamente disforme e assimétrico.

O apartamento era enorme. Haviam dois quartos e um quarto dos fundos onde se guardava a tralha. É claro que, pra completar, não faltavam estórias de assombrações devido ao seu ar sombrio. Minha irmã, Tina, muito talentosa, tem as melhores estórias de terror e suspense desta casa. Numa delas, dizia ela, a cadela da casa pediu água. Quando eu digo pediu, refiro-me a falou “áááá-g-u-aaaa”.

Mas são muitas, daria um projeto inteiro só com esses causos.

O chão era de taco antigo, que se revezava com pisos bem gastos ao longo dos cômodos.

Tinha uma estante de livros que ficava no corredor. Alguns gêneros bem esquisitos como fotos de acidentes de trânsito e uma coleção enorme sobre a URSS. Aliás, foi a primeira vez que eu li a sigla. Engraçado que ela marcaria parte importante da minha formação anos mais tarde.

Era impressionante como cabiam pessoas naquele lugar. Isso, desde sempre, segundo minha vó. Dizia ela que a sua casa sempre foi um entra e sai frenético. Os amigos do meu pai e tios, os amigos dos amigos... enfim, sempre havia gente.

Estudei lá perto durante alguns anos. É que todos os filhos do seu Carlos com a dona Elisabete estudaram na mesma escolinha nos primeiros anos de educação formal.

Quando meu vô ainda morava lá (eles se separaram alguns anos antes dela mudar pra outro apartamento) lembro-me que, por vezes, ficava gritando ele da grade da escola. Ele me buscava, e me entupia de caldo de cana e pãozinho delicia numa barraquinha que ficava na porta do prédio.

Aos 15 anos minha irmã mais velha foi morar lá. Lembro dos discos dela guardados no rack embaixo do som. Lulu santos, engenheiros do Hawaii, Caetano Veloso etc. Aliás, algumas músicas me remetem imediatamente ao anoitecer daquele lugar; a mesa do café, os adultos chegando do trabalho, meu pai e a chave do taxi balançando.

Era assim a casinha. Como deve ser pr´os outros?

Éééé... como o tempo passa e misturar nostalgia com projeção é uma engenharia que produz sensações bem destoantes.

Pois bem, estar vivo é ter memória... alguém disse isso durante o semestre.

p.s: quem sabe rola de construir um livro de memórias da casa? Vamos ver...

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